Um decreto do presidente Jair Bolsonaro publicado nesta quarta-feira (8) facilita o porte de arma para um conjunto de profissões, como advogados, caminhoneiros e políticos eleitos – desde o presidente da República até os vereadores.
O direito ao porte é a autorização para transportar a arma fora de casa.
O Estatuto do Desarmamento prevê que, para obtê-lo, é preciso ter 25 anos, comprovar capacidade técnica e psicológica para o uso de arma de fogo, não ter antecedentes criminais nem estar respondendo a inquérito ou a processo criminal e ter residência certa e ocupação lícita.
Além disso, é preciso comprovar “efetiva necessidade por exercício de atividade profissional de risco ou de ameaça à sua integridade física”.
O decreto de Bolsonaro altera esse último requisito, e afirma que a comprovação de efetiva necessidade será entendida como cumprida para as seguintes pessoas:
- instrutor de tiro ou armeiro credenciado pela Polícia Federal
- colecionador ou caçador com Certificado de Registro de Arma de Fogo expedido pelo Comando do Exército
- agente público “, inclusive inativo,” da área de segurança pública, da Agência Brasileira de Inteligência, da administração penitenciária, do sistema socioeducativo, desde que lotado nas unidades de internação, que exerça atividade com poder de polícia administrativa ou de correição em caráter permanente, ou que pertença aos órgãos policiais das assembleias legislativas dos Estados e da Câmara Legislativa do Distrito Federal;
- detentor de mandato eletivo nos Poderes Executivo e Legislativo da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, quando no exercício do mandato;
- advogado
- oficial de justiça
- dono de estabelecimento que comercialize armas de fogo ou de escolas de tiro ou dirigente de clubes de tiro
- residente em área rural
- profissional da imprensa que atue na cobertura policial
- conselheiro tutelar
- agente de trânsito
- motoristas de empresas e transportadores autônomos de cargas
- funcionários de empresas de segurança privada e de transporte de valores
O decreto foi assinado por Bolsonaro na terça-feira, em cerimônia no Palácio do Planalto. Na ocasião, ele mencionou que o decreto facilitaria o porte de armas para caçadores, colecionadores e atiradores – conhecidos como CACs – e não mencionou as demais categorias.
Além do porte, o texto altera as regras sobre importação de armas e sobre o número de cartuchos que podem ser adquiridos por ano.
Na avaliação de Bruno Langeani, do Instituto Sou da Paz, o decreto de Bolsonaro na prática libera o porte de arma para as categorias incluídas no texto, contornando a limitação imposta pela lei do Estatuto do Desarmamento. Essa lei diz que o porte de armas é proibido no Brasil, exceto em condições específicas.
“O presidente está legislando por decreto. Há projetos de lei em tramitação no Congresso para dar porte de armas para agente socioeducativo, oficial de Justiça… Se esses projetos estão lá e não foram aprovados, como pode o presidente, por decreto, passando por cima do Congresso, conceder porte de armas para essas categorias?”, questiona.
Conrado Gontijo, doutor em direito penal pela USP e professor de pós-graduação da Escola de Direito do Brasil (EDB) diz que o decreto cria a presunção de que os integrantes das categorias mencionadas precisam de arma, o que, na visão desse especialista, contraria a lei do Estatuto do Desarmamento.
“O pretendente ao porte deve demonstrar a necessidade que ele tem, na sua realidade de vida, de ter o porte da arma. O Estatuto do Desarmamento considera que deve haver um exame individualizado. Nesse ponto eu acho que pode ver um questionamento sobre a legalidade do decreto. O decreto não pode contrariar aquilo que a lei diz”, diz.