O arroz chamou atenção nas últimas semanas por ter se tornado um item valioso na cesta básica brasileira: com alta de 3,98% em agosto, o arroz acumula um aumento de 19,25% no ano.
No caso do feijão, dependendo do tipo e da região, a alta acumulada supera os 30%, de acordo com o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) de agosto. Completam a lista das maiores altas do ano o leite (23%) e os ovos (7,1%).
A inflação no prato do brasileiro despertou a dúvida: estamos prestes a viver uma sucessão de alta nos preços, no momento em que a taxa básica de juros (Selic) — usada para controlar a inflação — está no seu mais baixo patamar histórico? A resposta é não. A inflação recente observada nos alimentos é pontual e não deve se expandir para outros setores da economia, segundo economistas ouvidos pela BBC News Brasil. Mas o motivo por trás isso não é uma boa notícia.
“Não existe demanda que sustente um aumento de preços generalizado”, diz André Braz, coordenador do Índice de Preço ao Consumidor (IPC) do Instituto Brasileiro de Economia (IBRE), vinculado à Fundação Getúlio Vargas (FGV).
“No Brasil, a capacidade de consumo está freada pelo alto endividamento das famílias”, completa o economista Ladislau Dowbor, professor titular de pós-graduação da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP).
“Com exceção dos alimentos, estamos em deflação, as pessoas pararam de consumir. E o mercado de trabalho dinâmico vai demorar a voltar”, diz Maria Andreia Parente Lameiras, pesquisadora do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).
De acordo com André Braz, um dos fatores que explicam a alta recente no preço dos alimentos é o aumento da demanda interna. “A classe média brasileira criou um certo colchão de reservas, porque deixou de gastar com lazer e viagens, por exemplo, e com a pandemia ficou mais tempo na residência, o que a levou a cozinhar em casa”, diz.
Ao mesmo tempo, os mais pobres tiveram o auxílio emergencial de R$ 600 concedido pelo governo federal, e quase um quarto do ganho das classes menos favorecidas é destinado à alimentação. Houve uma maior demanda por alimentos, no momento em que a taxa de câmbio disparou, como reflexo do déficit público muito elevado, afirma Braz.
“Com isso, muitos produtores preferiram exportar parte da produção, já que existe uma alta demanda por alimentos em todo o mundo, especialmente da China, com a compra de grãos e proteína animal”, diz.
Assim, na equação entre alta demanda e baixa oferta, o preço sobe. Essa pressão sobre o preço dos alimentos deve se manter até o fim do ano, mas em menor proporção, segundo os economistas.
“O colchão da classe média vai se tornando cada vez mais fino com o passar do tempo, enquanto o auxílio emergencial, cujo valor já caiu pela metade – são R$ 300 -, só será concedido até dezembro”, afirma Braz.
“Uma queda mais significativa no preço do arroz deve ser observada no começo do ano que vem, com uma nova safra”, diz Maria Andrea.